Eram longos
os dias. Eram longos os dias atrás daquelas paredes cinza, já levemente
descascadas, com teias de aranha nos cantos do teto, aqui e ali, e com manchas
de mofo no teto, resultado das diversas goteiras acumuladas com o passar do
tempo, e cujas telhas nunca foram trocadas para sanar o problema. Quando
chovia, parecia haver mais água dentro do cômodo do que fora, e a correria
geral para tirar os papéis e as máquinas e os fios do alcance da água
escorrendo, incessante.
Eram longos
os dias. Maçantes, também. Desejava, a todo o momento, que o dia acabasse logo,
que aquele relógio que ficava ao alcance dos meus olhos e que tiquetaqueava
seus ponteiros com um som alto demais, os braços já cansados com o tempo que
estava ali, passasse a correr, e não se arrastar pelos números já desbotados no
painel de acrílico. Eu só queria ir embora. Só queria, descolar minha bunda do
meu assento e largar os papéis sobre a mesa e passar por aquela porta e.
E?
E aí, sem
saber o que fazer, para onde ir, eu encontrava mais um documento para digitar,
mais uma conferência para fazer, mais uma agenda para cumprir, e que era
inadiável, sim, inadiável. Eu não poderia deixar isso para amanhã, não. Na
verdade, poderia, mas. Se eu saísse dali, o que eu faria? Voltar para casa,
talvez. Mas pensar em voltar para a casa, me causa uma certa tristeza, uma
melancolia, uma solidão. A mãe e o gato morreram no mesmo dia. O gato,
atropelado. A mãe, de tristeza. O único morador da casa que ela amava, acabara
de morrer. Ela não tinha mais sentido. E aí, entrar em casa e ficar mirando os
portarretratos da mãe já falecida, dos irmãos que nem sei se ainda vivem
também, e do gato persa atropelado e estraçalhado nas rodas de um Chevette 82,
me causavam uma tristeza tão grande, que eu encontrava mais razões para ficar
mais um pouco.
Eram longos
os dias. Eram bastante longos, e maçantes, e cansativos. Os móveis, aqui, já
estão todos velhos, carcomidos pelo tempo e pelo uso. Os uniformes cinzas se
mesclavam aos rostos cinzas e aos cabelos grisalhos e aos olhos sem vida, e
tudo era tão mecânico que tornava todos os dias a mesma coisa. Mas, ainda
assim, ali eu me sentia mais. Mais. Mais seguro, talvez. Tudo fora dos meus
papéis e dos meus arquivos e dos meus mofos e das minhas aranhas que tinham até
nome e me liam os pensamentos e confidências, tudo além disso me soava tão
hostil e colorido demais e perfumado demais e limpo demais e assustador demais.
Então, eu me dedicava a ficar um pouco mais aqui. Um pouco mais. Porque, de
verdade, é inadiável. Eu não posso deixar isso para amanhã. E digitava mais um
documento. E outro, e outro. Até deixar cair o rosto, de cansaço, nas teclas da
velha máquina de escrever, e adormecer. Para, então, acordar para um outro dia.
Para mais um longo dia. Afinal, eram longos os dias.
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