Era um som tão alto que eu o sentia dentro de mim. Atravessando-me como uma adaga afiada, atirada diretamente no centro do meu peito. Eram gritos tão fortes, tão corajosos e, ao mesmo tempo, tão desesperados, que não era identificável se a massa de pulmões gastos era formada por jovens iniciando uma rebelião, ou por miseráveis fugindo do fogo que consumia suas casas. Apenas era possível escutá-los.
Eu não sei há quanto tempo não via a luz do dia. Permanecia intacto e protegido de mim mesmo há tantos anos que, minha única lembrança de vida, são os beliscões que dou em mim mesmo, dando-me certeza de que, ao menos, ainda consigo sentir dor. Também não sei por quanto tempo.
Ouvia aqueles gritos vindo de algum lugar, que eu não sabia onde era. Se vinham de cima, de baixo, dos lados. Apenas desejava ansiosamente que eles fossem fortes o suficiente para explodir as paredes frias e mucosas que circundavam minha existência, e me jogassem no meio de sua misericórdia honrosa, me pisoteassem e me destroçassem. Talvez assim, destruído, derrubado, com poeira no corpo, e feridas por toda minha pele, eu lembrasse de como é se sentir vivo.
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