A corda estava ali, pendendo do teto, já fazia alguns meses. Já havia se tornado uma peça decorativa do quarto, apesar de sua cor clara e seu aspecto quase mofado destoar absurdamente das peças de marfim, um pouco gastas, que constituíam o mobiliário do quarto.
A corda estava ali esperando o momento certo de ser usada. O momento certo, não. A coragem certa, essa é a palavra correta a ser utilizada. Fazia muito tempo que as coisas haviam perdido a direção. Mas maior que a venda que cobria os olhos para conseguir enxergar um caminho menos espinhoso para continuar caminhando, era a agonia do durante. Asfixiou-se uma vez, quando criança, debaixo d'água, quando tentava aprender a nadar no mar, e desde então a sensação de perder a respiração era algo que o deixava com um pavor imenso. Ou quando prenderam sua cabeça debaixo de um travesseiro enquanto socavam seu estômago. Experiências de tirar o fôlego. Literalmente.
Apesar deste agravante, contudo, a corda continuava ali. Pendendo do teto. As convenções sociais já não mais pareciam possíveis, de um tempo pra cá. O velho sorriso que aprendera a carregar para todos os lados desde o dia em que, quando criança, esqueceu-se de como era rir, já começava a mostrar rachaduras nos cantos e ficar bem pouco crível. As conversas eram tão vazias que os silêncios duravam horas. Às vezes dias. E as pessoas tão distantes e deslocadas de sua realidade que ele nem via mais motivo pra retornar o diálogo. Pra responder um "tá tudo bem?" por pura educação.
Não, não tava tudo bem, porra. Não tá tudo bem há muito tempo, mas você realmente não quer saber. Então, pra quê pergunta? Não tá tudo bem, tem uma corda pendurada no meu quarto e um currículo de partes deterioradas deixadas pelo caminho que já não mais se reconstituem. Não tá tudo bem, não precisa perguntar.
Se for pra responder um "tá tudo bem?" por pura educação, ele preferia não responder. E seguia andando.
Os estímulos agora eram apenas de viver a própria rotina, voltar para o quarto com móveis de marfim um pouco gasto, deitar-se na cama que já tinha perfeitamente o formato de suas costas, e permanecer ali em seu pequeno coma diário aguardando um novo dia nascer para que o cotidiano possa o engolir durante uma média de 10 horas diárias. Poucas as perspectivas de sair deste ciclo. Em partes pela sua já conhecida falta de coragem, e também porque poucas das vezes em que procurou pisar fora da trilha já estabelecida, deparou-se com ainda mais fracasso. Só mais um pá de terra pra aumentar a sua cova. Agarrava-se, então, nas paredes terrosas do buraco, e ainda mais sujo e arranhado, voltava para o caminho original.
E assim, seguia. Com a capacidade de crer em si mesmo cada vez mais abalada e rota, a corda continuava ali. Pendendo do teto. Com o nó já preparado para se fechar, e quando isso acontecesse, ele teria o tamanho exato do seu pescoço. Talvez só um pouco mais forte. Só aquele último abraço que seria, talvez, um pouco sufocante.
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