domingo, 28 de junho de 2015

De Atlântida

Clarisse,

Desde o dia em que pisei no porto, algo me dizia que não deveria entrar naquele navio. Uma força me impelia para longe, tentava me manter distante. Ouvi a tua voz todas as noites que antecederam ao dia em que o navio partiria. Você me dizia, com sua voz calma e suave, de que eu deveria ficar. De que eu deveria voltar. Quando acordava, porém, isso me dava ainda mais força para ir contra o teu pedido, pois eu sabia, Clarisse, que mesmo se eu ficasse, você não abriria tuas portas pra me ver.
Por isso, parti. Sentia todas as vibrações que emanavam daquele navio, da proa à popa, e já me preparava para o momento em que toda aquela estrutura, gigantesca, entraria em colapso. Quando vi, pendurado no mastil, que a tempestade se formava, em meio ao Oceano, sentei-me na vigia, fechei os olhos, e esperei a onda virar o casco do navio, e meu corpo encontrar com a água.
Você não pode imaginar qual foi o meu espanto, Clarisse, quando me vi acordando, deitado em uma cama dourada, e vários olhos grandes me observando, de muito perto. Não conseguia identificar o lugar. Primeiro, acreditei ser aquilo uma colônia espiritual. Mas, sou consciente de que não seria esse meu destino quando dessomasse. Que me esperam alguns períodos de limbo, de que minha alma não é tão limpa assim. 
Sentei-me na cama, e me contaram do meu resgate. Perguntei dos demais tripulantes, Clarisse, mas eles disseram que salvaram apenas a mim. Que fui o único que sobrevivi ao desastre, e que havia uma luz que emanava de mim, e que isso foi o que os atraiu para encontrar o meu corpo. 
Me disseram, também, que essa luz ainda brilha quando eles me veem. E que ela aumentava, absurdamente, quando, mesmo desacordado, eu chamava o teu nome. Teu nome, Clarisse, que faz de você brilhante, iluminada, faz emanar de mim uma força que eu não sei identificar. Que eu não sei controlar, e que, em qualquer lugar, mesmo debaixo do Oceano, entre os filhos de Poseidon, é impossível de negar. 
Salvaste minha vida com o teu brilho, e eu gostaria de poder salvar a tua com o meu amor, e te trazer pra morar comigo, nessa cidade que todos esqueceram, mas que nunca esqueceu de mim. Abre as tuas portas, e mergulha comigo, Clarisse. Não sei quanto tempo permaneço aqui, mas por muitos outros séculos, eu vou esperar pela tua mão.

Com sobrevivência e silêncio,

seu James Dean

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