terça-feira, 2 de junho de 2015

Desalinhado

Senta aqui ao meu lado, e me conta. Pode ser sincero, não há o que esconder. Não há nada que eu já não tenha notado, que eu não tenha percebido. Que você já não está mais aqui, que seus olhos já não passam mais pelas mesmas paisagens que os meus, que os teus sonhos diferem em cores e traços dos meus pesadelos escuros e sem formas definidas. 
Já não tenho mais medo de saber as verdades, sabe? Grande parte delas eu já senti chegar como uma brisa fria e inesperada, como sussurros no silêncio. O teu corpo já me dizia, os teus adeuses cada dia mais longos, as tuas vindas cada vez mais inconstantes. Tudo era claro, só não eram as palavras vindas da tua boca. Não que fossem mentiras, não. Acredito que, em algum lugar dentro de ti, havia um espaço para as verdades que me envolviam e que me faziam ser parte de ti. Mas este cômodo agora não tem mais janelas, e as paredes estão se fechando cada vez mais. Está apertado, escuro. E minha claustrofobia está me fazendo estourar as paredes com os braços.
Portanto, venha aqui. De uma vez por todas, sem meias palavras e abraços partidos. Senta ao meu lado, e me fala o que os seus olhos veem que os meus já desconhecem. As novas formas do mundo, as novas sensações sobre a pele. Qual é o sabor da boca, qual é o sabor das outras bocas, as formas dos outros corpos. As mãos que correm sobre as pernas, os dedos que se entrelaçam aos seus. Quantos são, como se chamam. Não, não o nome de batismo. Como se chamam na sua verdade, em seus devaneios. Me conta as nuvens no céu, os azuis diferentes em dias claros e escuros, e quando a chuva cai, como ela toca de leve na sua pele e penetra seus poros. 
Acredito que vá doer, acredito que vá machucar. Lágrimas cairão quando você partir, silenciosas e secas. Acredito. Mas eu preciso saber de você, eu preciso saber da sua boca. Outras vozes não me complementam, outros olhares não serão o seu. Então, senta aqui ao meu lado, e me mostra o mundo que nasceu depois de mim. 
Quem sabe, assim, eu possa reerguer um mundo em pilares que não sejam você.

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