Tenho tentado, à todo custo, oferecer a mim mesmo o amor que eu sempre esperei de ti. Estampei, por muitas vezes, na tua fronte, não o que eu esperava de ti - o que esperava da tua essência, do teu ser, e daquilo que você realmente tinha para me entregar, para me oferecer. Acabei, no entanto, impondo-te, quase que inconscientemente - ou acreditando que seja inconsciente apenas para ausentar-me da culpa de ter feito isso porque eu realmente quis -, a forma daquilo que eu considero correto.
Peguei os teus hábitos, teus gostos. Tua construção de realidade, teus desejos diários, teus sonhos futuros. Teus livros favoritos, teus discos mais antigos, teus amigos mais próximos. Tuas refeições, teus sabores na ponta da língua. Reuni as tuas poucas verdades expostas e as pintei abomináveis, dia após dias.
Cansei a tua existência, e a nossa convivência, com as minhas condenações, com as minhas censuras. Pra me respaldar, pra te convencer, eu estampava em mim fraquezas, inseguranças, e medos. Todos esses sentimentos reais, claro. Mas que não provêm de você. Que você não tem culpa. E que eu deveria ter superado sozinho. Que talvez eu já até tenha superado, no meu interior. Mas que guardei num armário, em formas de lanças, escudos, e flechas, para usar de armas quando você tentasse impor para mim o que você via como o mundo que te permeia.
Quando te perco, então, percebo que odiei quando você me mostrou quem realmente era, não porque você mentiu para mim o tempo todo antes de mostrar essa face que, na verdade, eu repudio. Odiei, sim, a pessoa que você se tornou quando cansou das correntes que eu mesmo criei pra te prender naquele palco em que eu te fiz boneco do meu próprio texto, da minha própria direção, iluminação, sonoplastia, e co-protagonismo.
Entendo, hoje, que eu queria, então, não amar você, nem amar a qualquer outro. Queria, sim, um outro corpo que representasse aquilo que eu entendo por correto, para tentar amar a mim, em outro corpo. Já que, por muitas vezes, não tolero, não aceito, e não amo a pessoa que vive dentro de mim mesmo. Projetar as minhas realidades para outro ser, a fim de que eu perceba que eu possa sim, ser amável. Ser amado. Por isso, lamento o ditador que eu fui aos teus dias, e declaro que tenho tentado, à todo custo, oferecer a mim mesmo o amor que eu devia ter dedicado não a você, mas a mim mesmo.
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