quinta-feira, 4 de junho de 2015

Sobre Partir

Se for pra partir, que parta de uma vez. Se destrua em pedaços, se desfaça em milhões, esfarele no chão até não mais existir. Moa todos os pedaços com as mãos, pise em cima, esfregue no assoalho, até não sobrar vestígio. Varra o pó pra fora, deixe se misturar com as folhas e com o vento e que tudo isso voe para muito longe daqui. Para muito longe de mim.
Se for pra partir, que parta de uma vez. Vá embora, sem olhar para trás, sem procurar os meus olhos por cima dos ombros e tentar me fazer pedir pra que fique. Saia, pegue suas coisas pra não mais voltar. Leve contigo os livros, os discos, as fotos. As roupas, a sua coleção de canecas, os seus vinhos amargos que ninguém, além de você mesmo, consegue tomar. Não esqueça de levar a coberta, os tapetes manchados, e se ainda sobrar espaço, leve também o pedaço de mim que está apodrecido e machucado de você, e todas as lembranças e momentos que estão incrustados nele.
Se for pra partir, que parta de uma vez. Cada um para o seu lado, e que esta separação seja definitiva. Sem chances para outros toques, outras lembranças, outras tentativas. De tanto tentar depois de partir, eu já não sei mais como tentar ser eu mesmo dentro dos meus próprios sentimentos e sensações. Sem ouvir as tuas outras vidas, tuas outras verdades. Por mais que eu escute, e sorria, por dentro meu coração se aperta, a respiração falha e a sanidade se esvai.
Se for pra ficar, porém, que parta de você. Parta de você a razão, e todos motivos que me façam crer que, desta vez, não haverão mais razões ou motivos para partir, partir, ou partir. Portanto, se for pra ficar, que fique por inteiro. Que fica de verdade. Que fique pra ficar.

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